Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Quase nove anos após ser impedida pela Justiça de
transferir para a Bahia parte das milhares de toneladas de resíduos
tóxicos armazenados há décadas em terrenos da Baixada Santista, a
empresa Rhodia foi novamente autorizada a enviar uma parcela do lixo
para ser incinerada em Camaçari, região metropolitana de Salvador (BA).
O material, comprovadamente cancerígeno, é resultante do processo de
produção da antiga estatal francesa, hoje pertencente ao grupo Solvay.
Durante décadas, o resíduo foi descartado inadequadamente em terrenos
baldios de pelo menos três cidades da Baixada Santista, sendo
considerado um dos maiores casos de contaminação industrial no Brasil.
Procurados pela Agência Brasil, os órgãos
ambientais responsáveis por autorizar a incineração, a Companhia de
Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), de São Paulo, e o Instituto
de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), da Bahia, garantem que a
segurança da queima do lixo industrial foi confirmada por meio de testes
realizados com amostras do material enviadas pela Rhodia para a Cetrel
Lumina Soluções Ambientais, instalada no Polo Petroquímico de Camaçari e
a quem pertence o incinerador.
Segundo a agência da Cetesb em Cubatão, o Certificado de
Movimentação de Resíduos de Interesse Ambiental (Cadri), concedido a
Rhodia em dezembro de 2011, prevê o transporte e a queima de 760
toneladas anuais de material contaminado para Camaçari. Segundo o
gerente da agência, Marcos da Silva Cipriano, os primeiros carregamentos
de lixo tóxico já teriam sido encaminhados à Bahia. A Rhodia e a Cetrel
Lumina confirmaram a obtenção das autorizações mas, devido ao feriado,
não forneceram mais detalhes sobre a operação.
De acordo com os órgãos ambientais, ao menos duas fases de testes
foram realizadas a partir de 2008 para confirmar o grau de eficiência do
incinerador para destruir os principais compostos presentes nos
resíduos sólidos e líquidos provenientes da Rhodia. Além de serem
submetidos ao instituto ambiental baiano, os resultados dos testes
também foram apresentados ao Ministério Público da Bahia que, segundo
Cipriano, aprovou, juntamente com o Ministério Público de São Paulo, o
transporte e a queima do material.
“Emitimos o Cadri com base nas aprovações de todo mundo lá da Bahia
e, pelo que sei, já houve uma remessa de material. Nossa expectativa
agora é que o problema seja resolvido em breve, embora ainda não
tenhamos prazos estabelecidos. Vamos cobrar isso da empresa”, disse
Cipriano.
O coordenador de licenciamento de indústrias e serviços do Inema,
Leonardo Carneiro, confirmou que após os testes de queima, o órgão
ambiental baiano atestou à Cetesb que a Cetrel Lumina tem capacidade
técnica para incinerar os resíduos e está devidamente licenciada para
isso. Não descartou, contudo, eventuais riscos envolvidos na operação.
“O incinerador já funciona há muito tempo e, em termos de controle de
emissões atmosféricas [de poluentes resultantes da queima], está
tecnicamente apto a incinerar este tipo de resíduo. Logicamente, toda
atividade licenciada tem um risco, um potencial de impacto, e sempre
haverá questionamentos”.
Os testes de queima foram uma exigência do Ministério Público baiano
para autorizar a operação. Em 2003, a multinacional já havia obtido o
aval dos órgãos ambientais oficiais paulista e baiano para transportar e
incinerar parte do material contaminado por compostos organoclorados,
como o pó-da-china (pentaclorofenato de sódio) e o hexaclorobenzeno. A
Rhodia chegou a enviar para Camaçari 3,6 mil toneladas que estavam
armazenadas em um dos cinco terrenos contaminados, no litoral paulista,
mas foi impedida de continuar com a operação devido à proibição do juiz
Ricardo D'Ávila, da 5ª Vara da Fazenda Pública da Bahia.
Em fevereiro de 2004, o juiz concedeu a liminar pedida pelo então
deputado estadual baiano Justiniano Zilton Rocha (PT) que, em uma ação
popular, apontava, além dos riscos do transporte, o fato de que
“pesquisas feitas pela comunidade internacional e órgãos ambientalistas
atestam que, com a tecnologia atual, nenhum incinerador opera com 100%
de eficiência, transformando-se em nova fonte de poluição, já que o
material contaminado entra no incinerador como sólido e sai como
fumaça”. A tese, segundo vários especialistas, é que junto à fumaça
seriam emitidas outras substâncias igualmente tóxicas.
Cipriano, da Cetesb, refuta a opinião. “Como técnico, não enxergo
outra solução [para eliminar os resíduos] fora a incineração. Se o
incinerador está trabalhando adequadamente, na temperatura apropriada e
atingiu os objetivos estabelecidos pelos órgãos ambientais com relação
às emissões atmosféricas, não há porque negarmos a autorização”,
comentou o gerente da agência de Cubatão.
Ao contrário de 2004, quando o lixo tóxico era proveniente de São
Vicente, a Rhodia procura se livrar agora do material acumulado em
Cubatão, em um terreno onde até 1993, funcionava uma das fábricas que a
empresa francesa mantinha no país. Naquele ano, a justiça paulista
interditou a unidade por considerar que, diante das denúncias de
intoxicação de funcionários da Rhodia e da confirmação de que a empresa
havia enterrado parte de seus resíduos no solo da fábrica, não havia
condições ambientais para que os trabalhadores permanecessem no local.
Com a decisão, a Rhodia foi obrigada a interromper também a queima
dos resíduos em incinerador próprio, montado no interior da unidade, em
1987. De acordo com os funcionários da empresa reunidos na Associação de
Combate aos Poluentes (Acpo), o descarte indiscriminado fora da
fábrica, realizado por empresas transportadores contratadas pela Rhodia
para dar fim ao material tóxico teve início em 1977.
Além dos cinco terrenos contaminados em São Vicente (um dos quais já
está recuperado, segundo a prefeitura de São Paulo), foram
identificados três em Cubatão – incluindo a fábrica interditada em 1993,
e três em Itanhaém, a mais de 80 quilômetros do local onde os resíduos
eram gerados. Até hoje a Rhodia é obrigada a manter sob controle o
potencial contaminante e a qualidade dos indicadores ambientais nestes
locais.
Edição: Denise Griesinger
Fonte: Agência Brasil
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