"Na primeira noite,
eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim. E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão.
E não dizemos nada. Até que, um dia, o mais frágil deles entra sozinho
em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a
voz da garganta. E, porque não dissemos nada, já nada podemos dizer”
(Vladimir Maiakovski).
A carnificina é generalizada. A mídia, com
razão, protesta contra as 10 mortes diárias na cidade de São Paulo. Mas
não chama a atenção para as outras 137 em todo o país (confira nosso
delitômetro – www.institutoavantebrasil,com.br). Extermínio epidêmico.
Que está ficando mais complexo com a presença de milícias. Milícias
matando policiais, membros das facções matando gente das milícias e das
polícias, policiais matando gente de todo tipo. Eis: estudante da USP
sendo executado (O Estado de S. Paulo, 10/11/12, pág. C1); Pobres
coitados morrem por engano (O Estado de S. Paulo, 11/11/12, pág. C3);
homem é dominado e executado pela PM (O Estado de S. Paulo, 12/11/12,
pág. C3) etc.
Na primeira noite eles matam 10 ou 20, e não
dizemos nada. Na segunda noite eles matam mais outra dezena, e não
dizemos nada. No ano eles matam mais de 90 policiais, e não dizemos
nada. Em Salvador eles matam um advogado que defendia os pobres, e não
dizemos nada. O governador diz que “quem não reagiu está vivo”. Agora,
mesmo quem não está reagindo não está vivo (e não dizemos nada). O
governo diz que o PCC não existe (e não dizemos nada). Diz que o PCC é
coisa insignificante (e não dizemos nada). Conhecendo bem o nosso medo, a
política de extermínio aumenta a cada dia (e não dizemos nada).
Um
milhão e duzentas mil pessoas foram assassinadas no Brasil de 1980 até
hoje (e não dizemos nada). A cada nove minutos matam intencionalmente
uma pessoa no Brasil (e não dizemos nada). Os mortos não são nunca
ouvidos (Zaffaroni). E eles têm muita coisa a dizer (primeiro, que estão
mortos, que houve crueldade, que suas famílias sofreram). E porque
nunca dissemos nada, já nada podemos dizer (Vladimir Maiakovski).
Estamos voltando ao estado pré-moderno, onde o homem era o lobo do outro
homem. E não dizemos nada!
*Luiz Flávio Gomes, jurista, é professor e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. - www.professorlfg.com.br.
Fonte: Jornal do Brasil Online
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