Autor(es): Por Lucinda Pinto e João José Oliveira | De São Paulo
A possibilidade de o Banco Central voltar a cortar os juros em 2013
entrou no radar do mercado e começa a ser incorporada às projeções dos
economistas. Ainda não há revisão generalizada de cenários, mas é
consenso que a possibilidade de mais queda da Selic cresceu após os
dados recentes da economia.
Mas essa mudança de visão não vem acompanhada de ajustes para baixo
nas expectativas de inflação. A maioria dos especialistas ainda
trabalha com o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA) acima de 5,50% em
2013, mesmo considerando uma lenta recuperação da atividade.
Dos 19 profissionais ouvidos pelo Valor, o ajuste mais intenso foi
feito pelo Santander, que agora vê a Selic cair até 6,25% ao longo de
2013 e permanecer nesse nível até o fim de 2014. O Nomura mudou a
estimativa para o juro de 9% para 8,5% no fim de 2013. Já Lecca e Icap
passaram a trabalhar com estabilidade da taxa no próximo ano, ante
projeções anteriores de 8% e 8,25%, respectivamente. Mesmo caso do
J.Safra, que agora enxerga estabilidade da Selic em 7,25% até o fim de
2014; antes o economista-chefe Carlos Kawall projetava aumento de um
ponto percentual da Selic após o fim de 2013.
Segundo o economista do Santander, Cristiano Souza, os dados da
indústria ainda fracos mostram que o Banco Central precisaria fazer
mais cortes de juros. "Deve haver uma recuperação, mas em ritmo mais
lento do que se esperava". No novo cenário do banco espanhol, o alívio
monetário deve ser retomado em março, quando já estiverem disponíveis
dados do PIB referentes ao quarto trimestre de 2012 e os números da
indústria do início de 2013.
O que ainda não está claro para o especialista é se esse quadro de
atividade mais lenta permitirá um alívio na inflação. Assim, as
estimativas para o IPCA estão em processo de revisão: para 2013, a
projeção atual está em 6% e, para 2014, em 6,5% - teto da meta de
inflação. "Estamos discutindo o que deve acontecer, porque a inflação
sentirá o efeito da atividade mais fraca, mas também do câmbio
desvalorizado", disse, lembrando que há ainda dúvidas sobre o tamanho da
redução da tarifa de energia elétrica esperada para o próximo ano.
Os demais analistas que mantiveram as previsões admitem que a
política monetária passou a ter um "viés de baixa", depois que os
últimos dados de atividade foram revelados, por meio do Produto Interno
Bruto (PIB) do terceiro trimestre e da produção industrial de outubro.
"Parece que a preferência do Banco Central é por manter o juro estável
mais tempo, mas claro que o risco de novos cortes dos juros aumentará à
medida que outros dados de atividade ruins forem divulgados", afirma
David Becker, do BofA Merrill Lynch.
Ele diz que, mesmo com a possibilidade de um PIB mais baixo, o mais
provável é a Selic não ser alterada no ano que vem, mas voltar a subir
em 2014, até atingir o patamar de 8,75%. O economista cortou de 1,7%
para 1,1% a previsão do PIB em 2013 e de 4,2% para 3,6% no ano
seguinte.
Para a economista da Icap Brasil, Inês Filipa, dados fracos da
atividade têm efeito negativo sobre a confiança de empresários e
consumidores, o que afasta a perspectiva de juro mais alto. Já o
economista do Standard Chartered, Italo Lombardi, mantém a previsão de
Selic a 7,25% até o fim do ano que vem, mas admite que a chance de um
corte aumentou.
O que pode afetar o cenário é o risco de inflação, que pode ganhar
contornos mais preocupantes nos próximos meses. Becker, do BofA, lembra
que há pontos de atenção: piora na margem dos preços dos alimentos,
possibilidade de a redução da energia elétrica não vir na magnitude
esperada e risco de reajuste dos combustíveis em 2013, ainda não
contemplado no cenário do BC.
A evolução do câmbio, nesse contexto, amplia as incertezas. Inês
Filipa, do Icap Brasil, estima que a desvalorização de cerca de 10% do
real tem um impacto sobre o IPCA de 0,35 a 0,45 ponto percentual em um
prazo de 12 meses. "A desvalorização este ano está ao redor de 15%,
portanto o câmbio tem impacto relevante sobre o IPCA de 2012". E Ítalo
Lombardi avalia que o câmbio mais desvalorizado pode influenciar esse
cenário, mas marginalmente. "Podemos dizer que o BC estaria menos
disposto a cortar os juros se o câmbio desvaloriza muito mais",
acredita.
Na contramão da maioria, o sócio da Troster & Associados,
Roberto Troster, que comandou a equipe econômica da Federação
Brasileira dos Bancos (Febraban) por vários anos, avalia que os agentes
de mercado vão rever os cenários de juros baixos por causa da inflação
nos próximos meses. Para ele, os índices de preços não vão ceder, as
pressões vão aumentar, e o governo terá que elevar juros ano que vem.
"Todo mundo errou nas projeções de atividade por causa do problema da
defasagem, que é difícil calcular", diz sobre o ritmo da reação da
economia aos estímulos monetários, tributários e fiscais já lançados
pelo governo.
Troster diz que o problema da retomada de crescimento econômico não é
a falta de estímulos. "A cada rodada, eles perdem força", aponta. O
gargalo, diz o economista, está na política focada no curto prazo e
intervencionista que tem gerado incertezas e, assim, afetado a decisão
de investimentos dos empresários e executivos. "Não está vindo dinheiro
para projetos novos".
Segundo os dados divulgados ontem pelo IBGE, a produção de bens de
capital - termômetro do investimento agregado na economia - recuou 0,6%
entre setembro e outubro, já com ajustes sazonais, a terceira queda
mensal consecutiva. Em relação a outubro de 2011, a produção de bens de
capital caiu 5,8%.
Fonte: Valor Econômico - 06/12/2012
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