30/01/2013
Autor(es): Por José Sergio Osse e José de Castro | De São Paulo
Enquanto a tese de que o Banco Central decidiu deixar o dólar se
desvalorizar como forma auxilar de combate à inflação se fortalecia,
uma disputa especulativa ganhava fôlego no mercado financeiro. Nesse
cenário, o dólar sofreu nova depreciação ontem, de 0,8%, que o levou a
R$ 1,985, seu menor nível desde 28 de maio do ano passado.
O mercado futuro na BM&F tem sido palco, desde segunda-feira, de
intensas mudanças nas apostas dos investidores para o rumo do dólar. E
isso ocorreu exatamente após o BC realizar na segunda uma inesperada
rolagem antecipada dos contratos de swaps cambiais tradicionais.
De acordo com o economista-chefe da Votorantim Wealth Management,
Fernando Fix, o movimento no câmbio detonado anteontem com o leilão do
BC foi tão intenso que causou prejuízos significativos aos que
apostavam contra o real. A forte queda do dólar no dia deflagrou ordens
de "stop loss" (liquidação de contratos para evitar mais perdas) que
acentuaram ainda mais a baixa da moeda.
Segundo analistas, as movimentações dos investidores devem alimentar
novas quedas, tanto na BM&F quanto no mercado à vista, sob a
expectativa de que o BC quer um dólar mais depreciado. Com giro quase
20 vezes maior que o do segmento à vista, o mercado futuro, com suas
operações, acaba influenciando a cotação da moeda.
"Enquanto a percepção for de que ainda há espaço para a moeda cair,
mais o mercado vai abrir posições vendidas", disse Diego Donadio,
estrategista-sênior do BNP Paribas. Segundo ele, o BC deve deixar o
dólar cair para perto de R$ 1,90, ainda que preveja "barulho" por parte
do governo quando a moeda chegar a R$ 1,95.
Donadio, do BNP, acredita que abaixo de R$ 1,90 o dólar só se
manteria "artificialmente", com esforço ativo do BC, possivelmente
queimando reservas cambiais. Segundo ele, não há previsão de entradas
de dólares no país em volume suficiente para sustentar cotações abaixo
desse patamar.
Nesses dias, os investidores estrangeiros aumentaram e os bancos
reduziram suas apostas na queda da moeda americana. Os fundos de
investimento, por sua vez, diminuíram suas posições em favor da alta da
divisa dos EUA.
Dados da BM&F mostram que, na segunda-feira (último dia com
informações disponíveis), os estrangeiros elevaram sua posição vendida
em derivativos cambiais (dólar futuro e cupom cambial) em 15,59%, para
US$ 6,225 bilhões, a maior desde os US$ 6,267 bilhões registrados em 1º
de novembro. Os fundos, por sua vez, reduziram em 3,31% suas apostas
na alta do dólar, adotando posição comprada de US$ 11,063 bilhões. A
contraparte tanto dos estrangeiros quanto dos fundos foram os bancos,
que reduziram em 22,8% sua aposta na queda da moeda americana,
reduzindo sua exposição ao dólar a US$ 4,109 bilhões.
"Esse rearranjo de posições é bem relevante e deve continuar no
curto prazo", disse ele. Caso estrangeiros e fundos continuem vendendo
dólares, a moeda pode testar o piso de R$ 1,95 no curto prazo, prevê
Fix. "Levando em conta o receio com a inflação, acho que essa seria
taxa tolerável. Abaixo disso, não, por toda a questão da indústria e de
competitividade, que não é uma preocupação pontual do governo, e sim
de longo prazo."
Os bancos, por sua vez, devem continuar atuando como contraparte
desses agentes, reduzindo sua posição vendida, à medida que o mercado
se aproxima do que pode ser o piso do câmbio, disse Eduardo Velho,
economista-chefe da Planner Corretora. Além das apostas na queda do
dólar no mercado futuro, os bancos também carregam posição vendida de
US$ 8,030 bilhões no segmento à vista, segundo os dados mais recentes
disponibilizados pelo BC, no dia 23.
"Os bancos devem tentar reduzir um pouco sua posição vendida, pois
há um limite para a queda do dólar", disse Velho. "Uma virada de
posição vendida para comprada vai depender muito do nível em que o
câmbio se estabilizará. Se ele ficar perto de R$ 1,90, começa a valer a
pena apostar na alta."
Um estudo elaborado pelo doutor em economia pela Universidade
Estadual de Campinas Pedro Rossi mostra a relação estreita entre as
variações nas posições de estrangeiros e bancos nos mercados de
derivativos e a oscilação da taxa do dólar. A compra de US$ 1 bilhão em
contratos de dólar futuro por estrangeiros causa depreciação cambial
de 0,46%. Na ponta contrária, a compra do mesmo volume por bancos
provocaria uma apreciação de 0,5% do real.
Na segunda-feira, a queda da moeda foi ainda mais forte dada a
movimentação estratégica de alguns investidores, principalmente
estrangeiros. Eles forçaram ainda mais a baixa do dólar tentando
influenciar a Ptax, usada como referência para a liquidação de
derivativos cambiais, e alavancar seus ganhos com suas posições
vendidas em moeda americana.
Apesar dos sinais de que os estrangeiros continuarão vendendo
dólares no mercado de derivativos, e potencialmente puxando o dólar
ainda mais para baixo, o economista-chefe da BGC Liquidez, Alfredo
Barbutti, chama atenção para o que classifica como posição técnica
"frágil" do mercado, lembrando a posição vendida dos bancos no mercado à
vista.
"Em novembro, os bancos também estavam muito vendidos em dólar à
vista e houve aquela puxada", lembra ele. Naquele mês, o dólar chegou a
ser cotado a R$ 2,13, máxima da moeda desde 2009, em meio a um fluxo
bastante negativo e à piora no cenário externo.
Para Barbutti, as questões macroeconômicas ainda parecem ter mais
influência sobre a cotação do dólar mas, em algum momento, a posição
técnica frágil deve levar os bancos a comprarem dólares à vista.
"Eles estão vendidos no futuro e no à vista. Esse não é o padrão",
disse. "Uma dessas posições vai ter que ser desfeita, e se for [a
posição] à vista, esse movimento tende a puxar o dólar."
No exterior, o Dollar Index, que acompanha o desempenho do dólar
ante uma cesta de seis moedas, caiu 0,29% a 79,54 pontos, enquanto o
euro, principal componente dessa cesta, subiu 0,27%, para US$ 1,349,
após o fechamento dos mercados em Nova York.
Fonte: Valor Econômico
Nenhum comentário:
Postar um comentário
comente