08/10/2015 00h18
Brasília
Marieta Cazarré - Repórter da Agência Brasil
“Nossas terras não são as reservas indígenas. Nós fomos expulsos da nossa terra. Estas reservas foram criadas pelo extinto Serviço de Proteção ao Índio, que não era serviço de proteção ao índio. Para nós, estas são áreas de confinamento mesmo, onde somos subjugados, onde não temos autonomia. Hoje convivemos com violência, intimidações, perseguições, assassinatos, comandados pelos latifundiários de Mato Grosso do Sul. Venho trazer esse choro, esse grito de socorro, nós não aguentamos mais”.
A denúncia e o apelo foram feitos por Valdelice Veron, liderança indígena Guarani Kaiowá, hoje (7), na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, na audiência pública que discutiu os conflitos entre indígenas e proprietários de terras em Mato Grosso do Sul.
Os indígenas dizem ser vítimas de constantes ataques por parte de fazendeiros, da polícia e de políticos locais. Eles afirmam que os agressores utilizam armas de fogo, balas de borracha e promovem espancamentos. A demarcação de terras é uma das principais questões que levam ao conflito no campo.
Para João Pedro Gonçalves da Costa, presidente da Funai (Fundação Nacional do Índio), é preciso que haja entendimento entre as partes para resolver o conflito. João afirmou que decidiu reativar seis grupos de trabalho que estavam parados para dar continuidade aos estudos e levantamentos pendentes em Mato Grosso do Sul.
Deborah Duprat, coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, ressaltou que, apesar de terem sido convidados ao debate, representantes do setor produtivo e do governo de Mato Grosso do Sul não compareceram. “Essa recusa ao debate é uma recusa à disputa democrática e ao valor que foi reconhecido a esses segmentos importantes da sociedade brasileira”, afirmou Deborah.
“O Ministério Público Federal assinou um termo de ajustamento de conduta mediante o qual se estabelecia um prazo para a conclusão das demarcações no estado de Mato Grosso do Sul. Nós já passamos por três presidentes (da Funai) sem que isso chegasse a se concretizar. É fundamental mostrarmos que não há uma inércia, por parte do estado brasileiro, no reconhecimento desses direitos. A falta de ação do governo, ainda que tendente a evitar o conflito, só fez acirrá-lo”, disse Deborah.
Natanael Vilharva Cáceres, liderança indígena Guarani Kaiowá, também participou do debate. “Não estamos morrendo apenas por balas, assassinados. As crianças, todos os dias, estão sendo mortas psicologicamente quando são pressionadas, atacadas, impedidos de usufruir os direitos que tanto a gente preza, que é o direito de viver em paz. Hoje, somos vítimas de pessoas ligadas ao agronegócio. Quantos mais vão morrer para que demarquem as nossas terras?”, perguntou.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSC / SP) questionou a ausência de representantes dos fazendeiros e disse que “o Brasil, para crescer e seguir adiante, precisa ser enaltecido pelo trabalho e não dividido e querendo pegar a riqueza que é dos outros”. O presidente da sessão, deputado Paulo Pimenta (PT/RS) esclareceu que representantes dos dois lados do conflito foram convidados a participar do debate. Poucos minutos depois, durante a fala do presidente da Funai, Eduardo Bolsonaro deixou a sessão dizendo em voz alta “vocês não vão me intimidar”.
Gilberto Vieira dos Santos, representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), afirmou que nos últimos 12 anos, mais de 390 lideranças foram assassinadas em Mato Grosso do Sul. “São mais de 700 suicídios entre os indígenas de Mato Grosso do Sul. A mortalidade infantil naquele estado entre os povos indígenas é mais de cem vezes acima da média nacional. Não é só o direito territorial que está sendo negado. É o direito a vida”, disse Vieira dos Santos, segundo o qual é necessário que se investigue as milícias agrárias no estado: “A solução passa, efetivamente, pela investigação profunda por parte de órgãos externos.”
Edição: Jorge Wamburg
Fonte: Agência Brasil
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